O presente artigo trata da malfadada ‘taxa
de conveniência’,
abordando sua regulamentação e cobrança no âmbito do Estado do
Rio de Janeiro. Isto porque, se por um lado, a Lei Estadual n°
6.103/2011 admite a exigibilidade desta “taxa” (que, frisa-se,
nada tem a ver com o tributo denominado taxa),
por outro elenca algumas particularidades, as quais nem sempre são
observadas pelas empresas prestadoras do serviço.
Sumário: INTRODUÇÃO. 1. Definição. 1.1 Compras realizadas em pontos de venda autorizados. 1.2 Taxa de entrega. 2. Igualdade nas contratações. 3. Forma de cobrança. CONCLUSÃO.
INTRODUÇÃO
Com
a revolução digital, que dentre várias outras coisas, permitiu a
diminuição do preço de fabricação e de venda de um computador
pessoal, somado ao crescente número de casas conectadas à internet,
o comércio digital - também conhecido como e-commerce,
despontou.
A
prova cabal disto, esta no fato de que tarefas corriqueiras passaram
a ocorrer por meio digital. Assim, o consumidor que decide ir ao
cinema, poderá adquirir seu ingresso de três maneiras: 1.
comprar
diretamente na bilheteria, 2.
comprar
via internet, 3.
comprar
via telefone.
Ocorre
que, nas hipóteses de números 2 e 3, por se tratar de uma compra
realizada sem que o adquirente sequer saia de sua residência, há a
cobrança da chamada ‘taxa
de conveniência’,
que visa remunerar o prestador de serviço por esta comodidade
fornecida.
No
Estado do Rio de Janeiro, temos a Lei Estadual n° 6.103/11 - de 08
de dezembro de 2011, que visa regulamentar a matéria, ou seja,
permitindo a sua incidência, porém criando limites a serem
observados, com o objetivo de evitar o locupletamento ilícito.
1.
Definição
O
artigo 1º, em seu parágrafo 1º, conceitua a taxa
de conveniência
como:
“a
prestação de serviço de venda de ingressos para show, teatro,
cinema e outros espetáculos pela internet ou telefone, em conjunto
com a possibilidade do consumidor em imprimir o seu ingresso ou
retirá-lo em guichê específico para este fim”.
Dessa
forma, para que o fornecedor possa cobrar este encargo, deverá o
cliente comprar o ingresso desejado através da internet ou telefone.
1.1
Compras
realizada em pontos de venda autorizados
Entretanto,
e nos demais casos - p. ex., quando o consumidor deseja adquirir o
ingresso para um show em um ponto de venda autorizado diferente da
bilheteria oficial - seria legal a incidência desta taxa e, ainda,
sua regulamentação decorreria da Lei Estadual 6.103/11?
Salienta-se
que, até o momento, não há julgados no Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro versando sobre isto. Outrossim, entendemos que esta
cobrança é ilegal, pois ainda que se justifique sua exigibilidade
na comodidade - já que normalmente o ponto de venda é mais próximo
que a bilheteria oficial, o parágrafo citado é expresso em ligar o
conceito de taxa
de conveniência
ao
serviço de compra de ingresso ou convite por telefone ou internet.
Dessarte,
fazendo uma leitura a contrario
sensu,
verificamos a impossibilidade do fornecedor de serviço em cobrá-la,
vez que se a operação não ocorreu por telefone ou internet, não
há que se falar em taxa
de conveniência.
Por
amor ao debate, e em respeito ao princípio constitucional da
legalidade - art. 5º, inciso II da CFRB/88 - onde resta claro que ao
particular é permitido fazer tudo aquilo que não for proibido por
Lei, poderá o fornecedor valorar este serviço - utilizando ou
criando outra nomenclatura, e que teoricamente não se submeteria a
Lei Estadual 6.103/11.
Contudo
neste caso, o magistrado ao analisar o caso concreto, poderá e,
muito possivelmente utilizará a Lei Estadual supra através da
analogia, com fulcro de preencher essa suposta lacuna no direito, vez
que estamos diante de situações semelhantes.
1.2
Taxa
de entrega
O
artigo 1º, parágrafo 2º da Lei Estadual n° 6103/11, aduz que a
“taxa
de conveniência não corresponde à entrega do ingresso em
domicílio, ficando a critério do consumidor a contratação em
separado deste serviço”.
Logo,
vemos a intenção clara e expressa do legislador em diferenciar
estas modalidades de serviços, inobstante sua conexão quase
embrionária. Todavia, surge a dúvida acerca do que podemos entender
como comodidade ou facilidade.
Não
se mostra razoável o consumidor ter que esperar mais do que 20
(vinte) minutos em uma fila para retirada de seu ingresso previamente
comprado, ainda que o prestador de serviço disponha em seu site um
aviso para que aquele o faça com antecedência.
Isto
porque, não se verifica qualquer vantagem que possa este cliente ter
em comparação ao que deixou para comprar o ingresso no dia do
espetáculo, configurando um inadimplemento contratual e um
enriquecimento ilícito por parte do fornecedor.
2.
Igualdade de contratações
O
artigo 3º, a Lei Estadual 6.103/11, vedou a preterição do
consumidor que optar por comprar seu ingresso diretamente na
bilheteira oficial, ao dispor que somente poderá ser comercializado
o ingresso ou convite com a taxa de conveniência, quando
houver abertura dos postos de venda físicos.
Assim,
proíbe-se que o fornecedor, na tentativa de tornar seu serviço mais
atraente, empurre o pagamento da ‘taxa
de conveniência’
ao
cliente, cercando seu direito básico a liberdade de escolha e de
igualdade nas contratações, gravado no artigo 6º, inciso II do
Código de Defesa do Consumidor.
3.
Forma de cobrança
O
artigo 4º da Lei Estadual, tanto em seu caput,
quanto em seus parágrafos, buscou limitar as formas de cobrança da
‘taxa
de conveniência’,
evitando abusos por parte do fornecedor de serviço. A uma, estipulou
que seu valor deve ser fixo,
sem qualquer relação com o valor do ingresso, ou do setor e local
escolhido, ou ainda espetáculo (art. 4º, §1°).
A
duas, firmou o entendimento de que a taxa somente poderá ser cobrada
uma única vez, “independentemente
da quantidade de convites e/ou ingressos adquiridos”.
Dessa forma, não importa se o consumidor pretende comprar um único
ingresso ou dez, porque pagará apenas uma vez o dito encargo, o
qual, dentro da mesma casa, não poderá variar de preço.
Inobstante
isto, mesmo após a entrada em vigor da Lei Estadual n° 6.103/11,
não é raro nos depararmos com a cobrança pelos prestadores de
serviço em desconformidade com os padrões apresentados, o que,
frisa-se, é ilegal!
E
mais, é aqui que reside a maior parte dos abusos cometidos pelos
fornecedores, pois se aproveitam da ingenuidade do consumidor - que
desconhece as disposições da Lei Estadual 6.103/11, e acredita ser
“normal” a taxação de mais de um ingresso.
Insta
salientar que, para o mundo jurídico, tratando-se de esfera cível,
a suposta insignificância do que fora cobrado a título de ‘taxa
de conveniência’
não
obsta o direito de ação do consumidor lesado, tampouco diminui seu
valor.
Até
porque, ao fixar o dano moral, o juiz deverá levar em consideração
o seu caráter pedagógico punitivo, ou em outras palavras, o
magistrado deverá arbitrar uma quantia entendida como suficiente
para desestimular o Réu a continuar praticando aquela conduta, sem
que isto leve a um enriquecimento ilícito do autor.
CONCLUSÃO
Vimos
que no Estado do Rio de Janeiro, por força da Lei Estadual n°
6.103/2011, a cobrança da ‘taxa
de conveniência’
fora
tida como legal. Porém, este texto legal traça limites a serem
observados pelos prestadores do serviço, com fito de assegurar a
justa remuneração pela “comodidade” vendida e não mais que
isto.
Destarte,
temos que somente poderá começar a ser vendido os ingressos pelos
canais atrelados à esta taxa, quando da abertura dos pontos de
vendas físicos. Busca-se aqui, evitar que o consumidor seja obrigado
a adquirir o seu ingresso pela internet ou telefone e, por isto, a
pagar a taxa
de conveniência.
Ainda
em decorrência da limitação, verificamos que conforme disposto no
artigo 4º da Lei Estadual, o seu preço deverá ser obrigatoriamente
fixo, não podendo em uma mesma casa, variar em função do
espetáculo, valor do ingresso, local ou setor.
Corroborando
isso, o parágrafo 2º do artigo 4º, dispõe que a malfadada taxa
apenas incidirá uma única vez na compra realizada pelo consumidor,
sem relação com a quantidade de convites ou ingressos adquiridos.
Inobstante
tal estipulação legal, bem como a previsão de sanção
administrativa - nos termos do art. 5º da Lei 6103/11, é comum nos
depararmos com a cobrança indevida, em total afronta ao ordenamento
jurídico pátrio, seja pela incidência da taxa de conveniência
mais de uma vez numa mesma compra, seja pelo seu valor flutuante,
seja pela venda antecipada de ingressos pela internet ou telefone.
Verificamos
que, a Lei Estadual citada, condicionou a existência da ‘taxa
de conveniência’
à
aquisição do ingresso por meios nãos presenciais, a saber,
internet ou telefone e, portanto, a sua compra através de um ponto
de venda autorizado não é passível de cobrança deste encargo.
Por
fim, em razão da diferenciação entre taxa
de conveniência
e
taxa de entrega - art. 1º, §2º, resta a dúvida do que vem a ser
conveniência? Ter o consumidor que esperar por mais de 20 (vinte)
minutos, para retirar seu ingresso no guichê específico ainda
configuraria a conveniência?
O
assunto ainda é muito recente e, portanto, ainda não há
posicionamentos no TJRJ sobre ele, porém entendemos que não.
O
consumidor ao comprar um ingresso pela internet ou telefone e, por
conseguinte, ao pagar a taxa de conveniência, o faz por
desejar adquirir uma facilidade, uma comodidade, a qual talvez não
teria acaso arriscasse comprar diretamente na bilheteria, p. ex.,
evitar o deslocamento e possíveis filas.
Ora,
se o consumidor arca com a taxa
de conveniência
e
o fornecedor não lhe provê, há um patente inadimplemento
contratual. Logo, a espera por tempo acima do que poderia ser tido
como razoável, sem a devolução dos valores pagos pela taxa,
configura em um enriquecimento ilícito por parte da prestadora de
serviço, posto que vende um serviço, no caso a comodidade, que não
pode de fato fornecer.
Rio
de Janeiro, 07 de agosto de 2012.
Eduardo
Fagundes Filippo
Nenhum comentário:
Postar um comentário